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Carlitos

Carlitos has written 22 posts for In partenza

The Fallen Blog Rises

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“Coitado, só falta ele ser corintiano!” Vou lembrar do dia 19 de outubro de 2012 como o dia em que eu realmente voltei da Itália. Como sugerido no post anterior, por mim mesmo já que só eu escrevo aqui, considerava o motivo do recesso desse blog tão acompanhado pela minha mãe e mais 24 territórios à sua escolha, o fato de que eu comecei a sentir a vida em stand-by pouco antes de voltar e estava certo de que bastaria pisar em Belo Horizonte para que o controle-remoto fosse acionado e o LED vermelho fosse apagado (a.k.a. aquela luzinha vermelha da televisão que apaga quando nós a ligamos).

Até pouco tempo atrás pensava que fazer ao programa menos italiano possível, ir ao cinema logo depois da chegada, no dia 1o de setembro, assistir “The Dark Knight Rises” com legendas e escutar a voz ORIGINAL do Bane, seria o marco final, após dois churrascos com familiares e amigos nos dias anteriores, que a vida se movia de novo. Switch on.

O fato é que a comparação com a televisão não cabe. Quando apertamos o controle, uma onda eletromagnética é disparada e, em questões de bilhonésimos de segundo, é responsável por ligar a TV. Para se tirar uma vida do stand-by pode ser necessário muito mais tempo. A verdade é que eu tenho muita sorte. Muitas mãos tentaram apertar o controle remoto, sem sucesso. O problema, provavelmente o de sempre. Baterias descarregadas.

A mão pra quem eu me apresentei “muito prazer, Carlitos” no meio de outubro foi a que conseguiu. E foi a que proferiu a frase do início. Ela já achava crueldade demais conhecer um físico. E argentino. Deu um palpite certeiro, verídico, sobre uma das melhores escolhas que eu já fiz na vida. Quis o destino (ou a minha ansiedade) que fosse apenas um decisivo empurrão, antes que ela seguisse seu caminho.

Sendo assim, em breve retornarei a Madrid, com o Custela e o Romero, a Nápoles com dois gregos malucos, a Bruxelas com a Cláudia e a mais outras cidades, até que eu termine o que eu me dispus a começar. A disciplina pra terminar coisas tão importantes, como um doutorado, começa pela disciplina em pequenas coisas, como histórias em um blog. E agora, com a vida novamente ON.

In Arrivo

Mãe, tô chegando!

 

“Acabamos de aterrisar no Aeroporto Internacional de Confins. Em nome do Capitão Manoel Joaquim e sua tripulação, a TAP agradece a sua companhia. São 15:23 e a temperatura é de 22 graus. Tenha uma boa estadia e esperamos revê-los em breve.” Sempre comecei os posts com frases verídicas, repassadas na íntegra, inclusive no idioma em que foi dita. Espero ouvir qualquer coisa parecida a essa que eu acabei de inventar, no dia 31. Provavelmente não acertei cada palavra que a tripulação portuga vai falar, mas seja o que for, não tenho nenhuma dúvida que vai disparar uma série sensações/pensamentos/expectaticas que vão terminar em vexame quando eu e meus 70kg de malas alcançarmos o saguão do aeroporto.

Não consegui manter o blog atualizado, ele ainda está parado no dia 3 de Janeiro de 2012, quando eu cheguei em Madrid. Ainda não falei da bichona do Cristiano Ronaldo, parado fazendo pose pra bater uma falta a menos de 10m de onde eu estava sentado. Não falei do camarada que mais irrita o Rogay no momento e nos dois gols que ele fez gripado, no dia seguinte. Faltou a melhor pizza da história do mundo, na terra da pizza, Nápoles. Até a Julia Roberts comeu. Lembram da história dos dois primos bobos dando derrame de rir no metrô de Londres? A história se repetiu em Bruxelas, mas não dentro do metrô, porque teve greve de transportes. Ainda tenho que escrever sobre o passeio de carro pela Toscana, onde se aponta a câmera pra qualquer lugar, de qualquer jeito e o resultado é uma foto fantástica. Sobre Modena, Maranello, Verona e Bologna. A sensação de pilotar uma Ferrari não vai ser possível. Como é que coloca no papel? A ICPS 2012, que me rendeu, além da participação na principal conferência em Física de Semicondutores do mundo, visitas às Cinque Terre, Gênova, Milão, Zurique e Lucerna também há de aparecer por aqui algum dia.

Esse estado de stand-by talvez se deve ao fato de que eu tivesse concentrato em viver os últimos meses da minha “vida de um ano” bem vividos. Talvez excessivamente concentrato nisso. Ou talvez porque foi um espaço que eu criei pra transmitir a parte bonita de se morar/trabalhar na Europa e, infelizmente nesses últimos meses, preocupações de fazer cair os cabelos acabaram ofuscando a parte boa. Mas uma vez que a hora de tirar minha vida real do stand-by já está ali na esquina, uma vez que eu me der conta que em meio às lembranças de conhecer lugares espetaculares foi também tempo de solidificar amizades que já eram queridas e elevar amizades que já eram sólidas até o Nível Supremo, seja mais fácil terminar o que eu comecei. E porque mesmo que eu comecei? Um pouco porque eu gosto de escrever coisas pra mim mesmo, um pouco porque tem sempre uma pessoa para ler o que eu escrevi (umas duas vezes e antes mesmo de eu acabar de fazer a correção ortográfica).

Oi mãe! Sabia que você ia chegar até aqui!

Se mais alguém chegou, nos vemos dia 31. No máximo dia 1o. A não ser que você esteja em Paris. Ou em Chicago. Barcelona? Eu tô quase em casa! 🙂

Até mais! Ele ainda vive!

Barcelona Parte I: 2011 termina no Camp Nou, 2012 começa no Montjuic

Feliz Ano Novo!

 

“Feliz Ano Novo!” Ou existe outra frase pra começar o ano? Talvez exista. E cidade melhor pra se começar um ano? Definitivamente não. Quando 2012 chegou eu estava no Eclipse Bar, no vigésimo sexto andar do W Hotel chamado de “El Hotel Vela”, pelo seu formato de vela de navio. De fato, quando ele é visto de longe, tendo o Mediterrâneo ao fundo, como na foto do post anterior, pode dar a impressão de ser um barco. Um bem grande. Voltando pra ordem cronológica…

Dia 30. Depois de um longo descanso, voltei pra estação de Sants. O bairro de Les Corts, onde fica minha casa  (a essa altura do campeonato eu já chamo de minha), é relativamente longe do centro e minha primeira parada seria o Bairro Gótico, no centro histórico de Barcelona. Saindo da estação Liceu, dei de cara com La Rambla, talvez a rua mais famosa da cidade, corta o centro histórico, descendo em direção ao Mar Mediterrâneo, unindo a Plaza Catalunya ao cais. La Rambla é dividida em três. Uma pista pra subir carro, uma pra descer e a do centro, maior e arborizada, para pedrestes. Cheia de lojas, sejam elas de grife ou de chinelagem, bares, cafés, restaurantes, boates, sex shops. A Plaza Catalunya, por sua vez fica entre o centro e Gracia, bairro de origem burguesa, levantado no início do século passado, respira pra sempre o modernismo dos arquitetos catalães daquela época, mas isso é assunto para a parte II.

Localizei um posto de informações turísticas dentro do Bairro Gótico e consegui o mapa do Corte Inglés, que o Romero diz ser o melhor de todos, o que ele sempre empresta pra quem chega e que depois ele nunca mais vê. 3G no celular eu não tinha graças à Movistar, então ele foi meu principal aliado nas andanças diurnas. Nas noturnas era só seguir o Romero e pronto. A Catedral de Barcelona, a gótica, foi a primeira visita. E aconteceu o que sempre acontece. Reforma… Fiz inclusive uma foto com cara de triste, com os andaimes avacalhando a fachada da catedral. De qualquer forma o interior e o exterior são impressionantes, a riqueza de detalhes do estilo faz o que é bonito de longe ser maravilhoso de perto. No interior uma espécie de jardim, com alguns marrecos passeando neles absolutamente tranquilos.

A Catedral de Barcelona

Do alto da Catedral. A Basílica da Sagrada Família no meio dos prédios.

A Basílica da Sagrada família

Eu tenho uma doença séria, a “Síndrome do Homem-Aranha”. Qualquer lugar que eu visito, procuro saber se tem jeito de subir no teto, terraço, torre ou qualquer coisa do gênero. E nesse caso tinha. O acesso ao elevador estava incluído na entrada pra visitar o interior. Lá no alto o “chão” e os corrimães eram todos de metal, construído por cima do telhado da catedral. E lá de cima eu aprendi, que tirando o centro, que é romano, a cidade é formada por quarteirões perfeitamente quadrados. Nunca tinha visto uma malha de prédios tão perfeita daquele jeito. Aprendi também que uma construção se destaca no horizonte. Muito maior do que tudo. 8 imensas torres (4 delas chegam aos 90 metros de altura) saem do chão e se destacam no meio dos quadrados milimétricamente ordenados. A Basílica da Sagrada Família.

Ao ver aquele “monstro” lá de cima, abri o mapa e fui entender como chegar lá. Sabia que ainda faria muitas andanças pelo centro e que qualquer coisa que eu fosse ver se ficasse pelo Bairro Gótico seria mal vista porque eu estava com aquele mastodonte na cabeça. E quando você cisma que quer ir ver uma coisa, é melhor ir ver logo. Rapidamente eu identifiquei no mapa a linha de metrô que levava à estação Sagrada Família e meia hora depois estava debaixo dela, com o pescoço dobrado a 90 graus, olhando pra cima e tentando em vão enquadrar o gigante em uma só foto.

Chegamos à parte em que eu devo confessar minha ignorância. Coloquei o pé em Barcelona sem nunca ter ouvido falar em Antoni Gaudí. E de certa forma foi bom, nunca mais vou esquecer a obra do camarada. A Sagrada Família é, por acaso, sua obra-prima. Catedrais costumam ter o formato de cruz, com a entrada principal na “ponta de cima” da cruz. A Sagrada família terá uma fachada em cada uma das três pontas de cima da cruz. Duas já estão quase prontas, a Fachada do Nascimento (que retrata o nascimento de Cristo) e a Fachada da Paixão (que retrata a crucificação). A Fachada da Glória ainda começou a ser construída em 2002. Gaudì morreu em 1926 e a Guerra Civil Espanhola acabou por destruir muitos projetos e maquetes que ele tinha deixado para a continuação. Só participou efetivamente da Fachada do Nascimento e da Cripta e o projeto foi sendo passado ano após ano a outros arquitetos catalães que deveriam sempre seguir as indicações de Gaudí, com uma ou outra inovação.

Naturalmente a Síndrome do Homem-Aranha atacou e lá fui eu tentar descobrir como subir em uma das torres. Em primeiro lugar eu tinha que pegar a fila. Gigante. Quando estava chegando a minha vez eu já começava a escutar: “Elevador? Torre? Subir? Não dá, ingressos esgotados!”. Quando eu comecei a pensar em desistir e voltar algum outro dia mais cedo pra poder subir, um francês devolveu o ingresso na minha frente, falando que tava desistindo. Eu era o próximo da fila, peguei o ingresso que tinha acabado de ser devolvido e fui ver Barcelona a 80 metros de altura. Quando eu desci percorri todo o interior e só fui sair da basílica quando já era noite. Não sem antes aprender que tudo aquilo que o Gaudí colocou a mão é diferente. Não dá muito pra explicar, além do que pode ser visto nas fotos. É simplesmente diferente. O cara sabia exatamente que cor e que forma um vitral, uma janela, uma coluna, um mosaico deveria ter e como seria a iluminação do lugar a partir disso.

Maquete mostrando o que já foi construído (marrom) e o que será contruído até 2026 (branco)

O interior da Sagrada Família

Os quarteirões quadrados de Barcelona

Voltei pra base pra tomar banho antes de encontrar o povo. Amigos de uma amiga que tem uma outra amiga que estava morando em Barcelona. Fomos pra uma boîte em La Rambla, “We Found Love” da Rihanna bombava sem parar. Na volta todo mundo com fome e… pera aí… Não tem absolutamente nada aberto pra comer. Não tem McDonald’s da Savassi. Não tem Paracone. Com muito custo achamos um taxi que topava levar até um Drive Thru do McDonald’s perto da Vila Olímpica, que fica aberto 24 horas. A única coisa aberta de madrugada em toda Barcelona.

No último dia do ano, fui direto pro Camp Nou. Pertinho de casa. Uma caminhada de 15 minutos pela Travessera de Les Corts. E na chegada dei de cara com um painel luminoso em uma das bilheterias: “Próximo Jogo: FC Barcelona X CA Osasuna – 04/01/2012”. Uma quarta-feira. Eu sabia que o Campeonato Espanhol só voltaria no fim de semana seguinte, que eu já estaria de volta a Lecce, mas tinha esquecido da Copa do Rei. Fui tomado por um sentimento de urgência. Essas bilheterias estão todas fechadas? Quando abrem? Que dia começa a vender? Súbitamente a visita ao museu + tour pelo estádio, o Camp Nou Experience, ficou em segundo plano. Perguntei pra um dos seguranças do estádio. Dia 02. Eu estaria em Madrid. “Mas não vende em outro lugar não, só aqui no estádio?” Segundo o camarada me falou, tinha um stand de informações turísticas em La Rambla, logo no começo, perto da Plaza Catalunya. Não tinha nada que eu pudesse fazer além de me concentrar na visita ao maior estádio (em capacidade) da Europa, palco da final de Liga dos Campeões mais emocionante de todos os tempos, a de 1999, e de tantos outros momentos históricos do futibas.

O Camp Nou Experience atende perfeitamente as necessidades de qualquer fanático. O tour é feito na seguinte ordem. Arquibancadas -> Zona Mista -> Sala de Imprensa -> Vestiário visitante -> Campo/banco de reservas ->  Cabines de Imprensa -> Museu. Logo que eu entrei no vestiário dei de cara com um mito. Martín Palermo. Monitores de TV mostramm fotos de todos os grandes jogadores da história do futebol que já usaram o vestiário e lá estava “El Loco”, de braços abertos, gritando um gol, vestindo o azul e ouro do “mais temido” de toda a América. No museu o de sempre. Objetos históricos, como a camisa laranja que o Michael Laudrup usou na final da Champions League de 1993, que o Barcelona conquistou depois de muito sofrimento ao longo dos anos, mais ou menos como um certo time paulista que vive correndo atrás da Libertadores. Trofeus. Milhões deles, incluindo um que tinha acabado de sair do forno. O Mundial de Clubes de 2011 depois de um cruel atropelamento em cima do time do Neygay.

A visita termina na loja do Barcelona, onde eu uni o útil ao agradável. Precisava de uma mala. Não iria dar pra voltar pra casa só com a mochila. Já tinha sido difícil na ida e iria voltar com mais coisas. Solução: uma linda mala de cabine do Barcelona. Terminada a visita fui direto pra Plaza Catalunya atrás do ingresso. Achei o tal ponto de informações turísticas no início de La Rambla e comprei. Recebi um voucher pra retirar o ingresso no dia do jogo. Desci La Rambla numa alegria incontida, passei em La Boquería, um mercado tradicional, digamos… análogo ao Mercado Central… Comprei uma camisa um pouco mais adequada à high society de Barcelona (outro dia vi uma foto do Piqué e da Shakira no mesmo Eclipse Bar, onde eu estaria em mais algumas horas. O FC Barcelona usa o hotel pra jantares, eventos e concentrações. Sim, ultra-high society). Quando cheguei na marina, no pé do Colombo, a noite já tinha caído e era melhor eu me aprontar pro ano-novo.

Nas arquibancadas do Camp Nou. Mais que um clube.

Chupa Neygay!

Difícil enquadrar tanto troféu. Vitrine dedicada a 2009, ano em que o Barcelona ganhou, literalmente, TUDO!

E a virada do ano foi bonita. Os fogos de artifícios estouravam bem próximos, a vista lá de cima é simplesmente perfeita. Eu passaria todos os anos-novos em Barcelona se tivesse jeito. Depois de ver os fogos e pegar alguns drinks no bar, com um barman que fazia altas acrobacias muito rápidas, eu acordei. O problema é que eu não lembrava de ter dormido. Enfim, era hora de voltar pra casa. Rachar um taxi com 8 pessoas. Fácil! O problema é quando 7 delas vão pro mesmo lugar e vc ainda tem que pegar o metrô pra terminar de chegar em casa. Foi aí que eu descobri que eu tenho um “modo piloto-automático” funcionou perfeitamente.

Dia 1º de Janeiro. Metrô em direção à Plaza Espanya, no pé do Montjuic. Na saída da estação uma ex-plaza de toros, que agora é um shopping e, no último andar, vista panorâmica da Plaza Espanya e do MNAC um museu-palácio que fica no que seria “a entrada principal” do Montjuic (olha a SHA de novo…). Uma das principais atrações do lugar, as fontes, estavam desligadas. Era de dia e era feriado. Lá do alto outra linda vista da cidade. E atrás do MNAC… 1992. Hein? Juro. Eu escrevo, se tiver ficado esquisito. Mil novecentos e noventa e dois. Eu tinha 9 anos. O arqueiro não acertou a pira. Marcelo Negrão acertou um ace. A União Sóviética virou Comunidade de Estados Independentes. Gustavo Borges foi mais rápido que a cronometragem oficial, mas um pouco menos rápido que Alexander Popov. Tudo isso aconteceu no Montjuic. Seja no Estádio Olímpico, nas piscinas ou no Palau Saint Jordí, que viu além do Ouro do Brasil no vôlei, Micheal Jordan e o Dream Team americano de basquete. No meio deles a Torre Calatrava, outro cartão postal da cidade. Uma torre de telecomunicações desenhada por Santiago Calatrava, um arquiteto valenciano, por ocasião dos Jogos. Quem conseguir enxergar um atleta se abaixando pra receber uma medalha, me conta como. Dizem que é isso que ela representa. É inclusive o troféu do Grande Prêmio da Espanha de F1, realizado anualmente no Montmeló, em Barcelona. Esse era muito longe, ficou pra próxima. Depois do Tour Olímpico fui andar de bondinho. E depois pro Castelo do Montjuic. O mais interessante é que ele é aberto ao público. Não se paga pra entrar nem nada e a vista lá de cima é espetacular. Fui embora de lá mais ou menos junto com o sol. Desci na estação Arc de Triomph (Barcelona também tem o seu) pra comprar a passagem de ônibus pra Madrid. Os dias 2 e 3 seriam na capital espanhola.

Passei em casa, arrumei a mochila e voltei pra pegar o ônibus que sairia à 1:00 da madruga. Era só uma viagem de dois dias. Não iria demorar. Pouco tempo depois eu estaria em casa de novo!

 

 

PRÓLOGO: Barcelona. Una. Dos. Y para siempre.

Barcelona em uma foto. O modernismo de Gaudí em primeiro plano, nas casas do Parque Güel e na Basílica da Sagrada Família, no fundo à esquerda. No centro da foto, La Rambla, cortando o Bairro Gótico, unindo o “burguês” bairro de Gracia ao Mediterrâneo. À direita bem no fundo o “Hotel Vela”, onde eu passei a virada do ano. Faltou só o Montjuic, mas já tem muita coisa na foto, não?

 

“Movistar le desea Feliz 2012”. Foi chegando perto a virada do ano e o slogan da Movistar mudou de “Movistar le desea Feliz Navidad” para esse. O que não mudou foi o fato do plano 3G não ter sido habilitado. Sem internet para matar o tempo enquanto esperava nas filas ou durante os trajetos de metrô por Barcelona, que eu arriscaria a dizer, é a cidade mais espetacular de toda a Europa. Se eu tivesse que escolher uma cidade entre todas as que eu já visitei pra colocar do lado de Belo Horizonte e Buenos Aires, no que diz respeito à afeição, enhorabuena, Barcelona, has ganado tu.

Mas quando eu cheguei na estação de Sants por volta das 20hs do dia 29 de dezembro eu ainda não sabia disso. Eu tinha que me concentrar no e-mail do Romero, sobre como chegar na padaria da esquina da casa dele e tinha só meia-hora pra fazer isso. Ela fecharia às 20:30. Por sorte, o primeiro parágrafo do e-mail era sobre como chegar na estação de Sants, vindo do aeroporto ou de outras estações mais centrais e o trem que vinha de Valência terminava a viagem justamente ali, em Sants-Estació. O e-mail do Romero era preciso, não que as limitações inerentes à minha pessoa não fossem confundir o conceito de subir ou descer uma rua (“saindo da estação sobe a Calle Numancia” porque a rua literalmente sobe, mas a Anta achou uma boa seguir a direção do tráfego, que fluia rumo à praia) sorte que descendo, a Calle Numancia muda de nome. 10 minutos depois localizei a entrada do prédio que seria minha casa pelos próximos 10 dias. Faltava só uma coisa, relativamente importante. A chave. E cadê a padaria que eu não conseguia achar? Liguei pro Romero, que estava em Bruxelas (esse blog ainda vai dar uma passada lá), e ele foi guiando essa pessoa limitada até a padaria. Peguei a chave com a Mariana, a dona, comprei uns muffins, entrei no apartamento e… Bilhetinhos carinhosos espalhados pela casa, dando instruções do tipo senha da internet, onde tem cobertor, toalha, essas coisas que eu não levei porque é impossível quando se viaja de Ryan Air. Dei o vacilo de não tirar nenhuma foto. Entre os bilhetes, um épico, pregado na porta da geladeira: “Tá cheio de cerveja! É pra beber”. Melhor anfitrião ever.

Cansado de correr por Valência e viajar mais 4 horas de trem, o negócio era comer e dormir. E no “comer” eu percebi que esse negócio de catalão, o idioma, é coisa séria. Muito séria. Desci na da pizzaria delivery vizinha à minha nova casa e o dono me fala: “pode escolher os ingredientes, é você quem monta”. OK, peguei o cardápio dos ingredientes. TUDO em catalão. Foi só o primeiro sinal. Achava que o catalão era um análogo aos dialetos locais aqui na Itália. Que era falada mais como segunda língua, talvez em família, como são os dialetos italianos, e que em um ambiente de trabalho ou estudo todo mundo falava entre si em espanhol. Neca. Primeiro vem o catalão, espanhol só em último recurso e o mais impressionante: os catalães falam espanhol com sotaque. E eu fiquei com a nítida sensação que não é um sotaque regional, como mineiro, paulista, gaúcho, carioca ou baiano falando português. É um sotaque de quem não está acostumado com o idioma, que não admite aquilo como seu, até mesmo que se sente forçado a falar.

Minha idéia inicial era dividir o post sobre Barcelona em dois, já que a minha passagem pela cidade ficou dividida em duas com uma breve ida pra Madrid no meio. Mas eu acabei retomando um ponto que ficou esquecido durante a descrição das últimas cidades. Sem perceber o foco dos textos passou exclusivamente para as cidades e eu acho que acabei deixando de lado a minha interação com elas. Os últimos posts foram excessivamente descritivos e pra isso existem guias turísticos. Mas Barcelona inspira. Só de voltar pro dia 29, na chegada em Sants, cada detalhe dos dias na melhor cidade do Mundo implora pra ir pro “papel”. Cada passo dado nessa cidade fantástica ficou guardado. Antes mesmo de começar a falar sobre ela eu já tenho um post. Graças à chave da casa do Romero, ao meu cérebro limitado e ao menu de ingredientes em catalão.

Quarteirões perfeitamente quadrados, obras de arte disfarçadas de prédios, o melhor time de futebol do Mundo, um monte palco de uma Olimpíada, um pintor que merece um museu só pra ele, porto, praia, um castelo, um centro histórico que escapa à sua maneira do clichê intrínseco à designação. A chegada de 2012. A noite por bares peculiares, únicos, dignos de aparecerem em filmes hollywoodianos. A rua que une o glamour e a chinelagem, e só termina (ou começa) quando Cristóvão Colombo apontar pra a América (ou paras Índias? Ou pra Gênova? Eu e o Custela ficamos discutindo: “Pô, a América tá pro outro lado, pra onde é que ele tá apontando, hein?”) . Se realmente todas essas lembranças couberem em “só” mais dois posts, serão dois posts muito, muito longos, mas eu garanto que não é só a minha mãe que vai chegar no final. Quem começar, só para quando acabar.

Barcelona inspira.

Correndo por Valência

A Cidade das Ciencias e das Artes. No fundo o Ocenógrafo, no meio o Museu de Ciências, na frente o Hemisferic.

 

“En la Ciudad de las Ciencias y las Artes no puedes dejar de ir. Solo del lado de afuera ya vas a llenar la memoria de tu cámara.” Quando eu cheguei em Valência eu não saberia direito o que iria encontrar. A única imagem da cidade que vinha na minha cabeça é o porto, onde está o traçado de rua do Grande Prêmio da Europa de Fórmula 1, já vencido tanto pelo Morto (em 2008), quanto pelo Inútil (em 2009). Além disso, eu tinha pouquíssimo tempo pra ver Valência, tinha chegado às 20:00h do dia 28 de dezembro e teria que estar às 16:00 do dia 29 na estação pra pegar o trem pra Barcelona e chegar lá antes das 20:30. Já que estava em um lugar propício, eu teria que correr. Por isso perguntei ao Ricky, porto-riquenho (Ricky, Porto Rico, Ricky Martin… OK, não tem graça…) dono do apartamento/albergue que eu fiquei hospedado, o que eu não poderia deixar de ver e ele recomendou o espetacular complexo de museus, situado na parte sudoeste da cidade, perto, inclusive, do porto.

Antes porém fui conhecer o centro histórico. Valência também é uma cidade Romana. Muros, portas de entrada, ruas tortuosas e casas antigas já viraram clichê quando eu escrevo essas duas palavras. Entrei por Puente Serranos enquanto conversava com mais uma atendente da Movistar tentando ativar o plano 3G para o celular. Andei um pouco pelo centro, vi que Dr. Gregory House estava pelas redondezas (foto no fim do post) e fui parar na praça da prefeitura de Valência, ou Plaza del Ayuntamiento, que ainda estava vestida de Natal. Na volta ao apartamento/albergue parei pra comer a famosa Paella Valenciana, que entre os ingredientes tem o coelho, comum aqui na Itália também. Mas fico meio triste em comer coelho. É um bicho que eu simpatizo. Se eu soubesse que tinha acho que não teria comido, só fui saber (ou lembrar, porque Don Guillermo já tinha me falado) depois…

No dia seguinte peguei o tram, aquele metrô que anda no meio da rua, em direção ao porto e fui andar no meio do circuito. Um fã de Fórmula 1 solto, descontrolado em um circuito… Resultado: foto no prédio da direção de prova, foto na ponte retrátil, foto na área dos boxes, foto na linha de chegada, um pouco mais rolava uma foto beijando o asfalto, mas à esse ponto não cheguei. Não por falta de vontade… O que eu achei estranho é que os prédios estavam completamente abandonados. Se não tem competição no porto, que abriga também a America’s Cup de iatismo, eles ficam jogados às traças.

Depois do porto rumei para a Cidade da Ciência e das Artes esperando ter tempo de ver, no mínimo, o Museu de Ciências Príncipe Fernando e o Oceanógrafo. Além deles o complexo é constituído do Hemispheric (um cinema IMAX), do Palácio das Artes Rainha Sofia (um…duh…museu de artes), o Umbracle (uma zona de jardins) e a Ágora (um centro de convenções). E o Ricky tinha razão. Tamanha era a beleza dos prédios (?) do complexo que rapidinho encheu a memória e eu tive que parar pra fazer o que eu apelidei de “Seção do Descarrego”, abrir o computador no meio da rua e passar pra ele as fotos da câmera, pra poder esvaziar o cartão de memória. Pouco antes de chegar no complexo, subi no último andar de um prédio do Corte Inglés, uma super-loja de departamentos que tem em cada esquina na Espanha, pra tirar fotos “aéreas” do lugar.

No fim das contas tive tempo só de ir no Museu de Ciências e gastei quase todo o tempo dentro da exposição do Indiana Jones, a melhor exposição que eu já fui na minha vida. Vários objetos de todos os filmes do Indy, reais, usados durante as filmagens, simplesmente espetacular. O museu em si tem várias coisas interessantes, para o delírio de físicos, químicos, engenheiros e biólogos, incluindo um Pêndulo de Foucault gigantesco. Quem nunca entendeu como provar por A + B que a terra gira em torno de si mesma entende rapidinho! Muita coisa interessante exposta, vários terminais com explicações dos mais diferentes fenômenos que envolvem as áreas que eu citei aí em cima. Um museu do Valencia FC, bi-vice-campeão europeu (2000/2001) e um da Marvel, não é à toa que o ingresso vale pra mais de um dia, não tem como ver tudo em um dia só e aquele era só um dos museus, pena que não deu pra visitar nenhum outro.

Peguei um ônibus em direção à estação, situada no centro de Valência, perto da Plaza del Ayuntamiento. Displays de LCD espalhados pelo bus indicam o trajeto que está sendo percorrido em um mapa, simplesmente não tem como errar. A Espanha é muito organizada, dá a sensação de estar realmente na Europa. Na minha opinião não deve nada em relação aos alemães ou aos ingleses no quesito “seriedade”. Um morador das cidades espanholas que eu pude visitar ou um turista que chegou há 10 minutos consegue fazer tudo com a mesma facilidade.

Chegando na estação, mais um lembrete de como é bom ser filho de Don Guillermo e Dona Neuza, mestres na arte da precaução. O trem pra Valência não sairia dali, mas sim de um novo anexo da estação central, acessível por um ônibus interno. Além disso, não aceitavam meu cartão italiano na hora de comprar a passagem pra Barcelona e eu tive que perder mais um tempinho pra fazer um saque. Se eu não tivesse chegado cerca de 40 minutos antes na estação tinha perdido o trem. E que trem. Luxuoso o serviço da Renfe, até aeromoça tinha. Ou seria Ferromoça?

Próxima parada: Barcelona-Sants. E a primeira parte da história na cidade mais legal que eu já conheci na vida.

Saludos.

A Virgem do Pilar de Saragoça

O Rio Ebro e a Basílica-Catedral Virgen del Pilar

 

“Eres Argentino?” Qualquer “hispanohablante” sabe quando é um argentino falando. Do mesjeitim que qualquer brasileiro sabe quando é um mineiro. No caso, eu liguei pro auto-atendimento da Movistar, compania telefônica espanhola, o (infame) serviço de telefonia móvel da Telefonica. A moça que me atendeu, em uma das 17 milhões de vezes que eu liguei atrás da ativação de um plano 3G, tinha sotaque mexicano e os mexicanos adoram o sotaque dos argentinos. E vice-versa. Viva o Chaves!

Cheguei em Saragoça (mami e papi vão odiar ler o nome em português, ao invés do espanhol Zaragoza) no início da tarde do dia 27 de dezembro. Viajando de Ryan Air, emoções são sempre parte do pacote. Você não sabe se o avião vai decolar. Se vai chegar a tempo. Se vão te cobrar excesso de bagagens porque você não conseguiu vestir todos os seus casacos de uma vez. Sendo assim, resolvi não reservar hotel em nenhum lugar na Espanha, amparado pelo fato de que eu tinha casa em Barcelona (muchas gracias, Romero) e liberdade pra me mover conforme as necessidades. E não por preguiça, tá OK? Não por preguiça!

Achei que seria possível ir pra Barcelona ainda naquela tarde, achava que em Saragoça, uma olhadinha na Virgem do Pilar e no rio Ebro seria o suficiente. Só que o bus que faz o trajeto do Aeropuerto de Zaragoza até o centro (passando pela Estação de Delícias, melhor nome de estação de trem/ônibus de todos os tempos) demorou mais de uma hora pra sair do Aeroporto, outra meia-hora pra chegar e eu resolvi que deveria procurar um lugar pra ficar e ir pra Barcelona no dia seguinte. A região do Aeroporto é extremamente árida. Lembra aquelas fotos de Brasília, na época que o JK mandou construir. Vários shoppings se localizam entre o aeroporto e o centro, dentro do semi-árido aragonês.

Dormir em Saragoça custou a facada de 38 euros. Mas tá bão, deixei minhas coisas no hotelzim e fui procurar duas coisas. A Virgem do Pilar e alguma operadora de telefone. Em Barcelona teria que pegar a chave da casa do Romero, encontrar com o Ariel e com a Lorena (fomos da mesma sala de italiano, ela ficou 6 meses em Turim. Encontramos 0 vezes na Itália, fomos encontrar na Espanha, pro ano-novo). Ou seja era melhor arrumar um número espanhol.

Antes de chegar na Virgem do Pilar uma paradinha para chinelagem, que é primordial. Um fast-food, tudo à 1 euro. Cafés, sorvetes, bocadillos… Maravilha! Pra chegar na Catedral, vindo do hotel onde eu estava desce-se a Calle de Alfonso I (mãe please, quem foi Alfonso I?), que é bem estreita e cheia de lojas, incluindo a fatídica Movistar. O chip custou 6 euros e veio com um celular junto. O fato de a rua ser estreita faz com que não se possa ter a dimensão do monumento à medida que nos aproximamos dele. A Calle de Alfonso I termina na Plaza de Nuestra Señora del Pilar, onde já é possivel ver a Catedral toda. Na praça um presépio em escala quase 1:1. Um pouco menor. Dava pra andar no meio dele.

Da praça quase dá pra ter a real dimensão da coisa. Quase porque só atravessando o Ebro pra poder enquadrar todas as torres da Catedral tanto na foto quanto no nosso campo de visão. O resultado é esse aí em cima. Eu acho que é a foto mais bonita que eu já tirei na minha vida. Manjou a lua no cantinho superior esquerdo (até porque se ela estivesse no canto inferior iria estar dentro do rio…)?

Depois de entrar dentro da Basílica-Catedral, fazer umas compras em um supermercado do outro lado do rio e passar pelo presépio andei de volta ao hotel e fui descansar porque tinha mais viagem no dia seguinte. Achava que era pra Barcelona, mas no fim das contas foi pra Valência. Logo de manhã fui pra estação de Delícias (fotografando tudo no caminho) saber os horários de trens e buses pra Barcelona. Eu tinha que chegar em Barcelona até 20:30, hora em que fechava a padaria da esquina da casa do Romero, onde ele tinha deixado a chave. Mas os ônibus que me deixariam em Barcelona antes desse horário estavam cheios. Dilema: gastar milhares de euros no confortabilíssimo trem da Renfe até Barcelona ou gastar essa grana pra ver um pedaço de Valência? Fui pensando enquanto voltava no hotel pra buscar minhas coisas.

Saragoça é uma cidade bem central com relação a Madrid, Barcelona e Valência. Fica exatamente no meio delas todas e o tempo é de 4 horas pra ir pra qualquer uma delas de ônibus, cerca de 300km. Decidi ir pra Valência e uma vez de volta à estação comecei a tomar as providências necessárias. Liguei pra moça da padaria pra avisar que eu só pegaria a chave no dia seguinte, conectei o celular na wi-fi do posto de informações turísticas da estação e achei um hostel por 15 euros. Liguei pro camarada do hostel pra perguntar se tinha vaga e qual era o endereço. Tudo acertado. Às 15:00 peguei o bus rumo à Valência.

Oi, Mar Mediterrâneo! Quanto tempo…

Saludos desde España

De Volta à Roma

Detalhes sobre essa foto no fim do texto. E nada de descer a barra de rolagem, tem que ler tudo!

“Feliz Natal!” Assim mesmo, em português. Pronunciado pelo Papa Bento XVI em umas 200 línguas diferentes, no dia 25 de dezembro, da sacada da Basílica de São Pedro. E quando um determinado grupo de um determinado país escutava o Papito falando na sua língua, isso era, naturalmente, comemorado como um gol. E ver a Praça de São Pedro completamente lotada continua sendo uma sensação fantárdiga!

A volta a Roma tinha 3 objetivos principais, além do objetivo óbvio, ir a Roma porque Roma é Roma e ponto final. Independente se está fazendo frio ou calor, se é a primeira ou a vigésima visita, se você vai sozinho ou acompanhado. Onde é que eu tava? Ah… os objetivos. Eram eles:

1 – Otimizar um roteiro em que fosse possível ver os principais pontos turísticos em dois dias. A Carol, uma amiga (linda) de BH, estaria em Roma por três dias, como parte de um super-tour pela Europa com mais outras duas amigas. A Aline, que eu já inclusive conhecia, e a Ana, que eu conheci lá.

2 – Consertar alguns erros que eu cometi na primeira visita, como por exemplo, não ir no Castel Sant’Angelo, não chegar nas margens do Tibre, não tentar ver a chaminé da Capela Sistina, não entrar no Museu do Campidoglio, não ir em Piazza Navona, só pra falar alguns…

3 – Seguir o Caminho da Iluminação de Galileu de acordo com o livro “Anjos e Demônios” e localizar os quatro altares da ciência. Tá bom, tá bom… É ficção… Mas tá tudo lá, custa parar pra ver?

Peguei o bus que faz o trajeto Lecce-Brindisi às 5:35 pra chegar cedo no aeroporto pra resolver um problema. Como fazer tudo que eu ia levar caber em uma mochila só, pra não pagar excesso de bagagem. Não cabia. Driblei a situação vestindo todos os meus agasalhos, levando o maiorzão na mão e enfiando dentro das mangas dele meu sapato, que eu levei para ano novo e pra eventuais saídas na night. Nível absurdo de pobreza. Mas pra quem eventualmente for viajar de Ryan Air e precisar de dicas chinelais, pra não pagar 40 euros, pode deixar que eu ensino depois…

Cheguei no centro de Roma por volta das 11:00 e de cara reconheci a rua que levava ao hotel que eu tinha ficado da última vez, 6 anos atrás,  e que eu iria ficar de novo. Como meu cérebro é capaz de uma coisa dessas e de ao mesmo tempo esquecer meu cartão de crédito no McDonald’s da estação de Termini (mais detalhes um pouco mais à frente) eu nunca vou entender… Deixei a mochila lá e fui procurar a Chiesa di Santa Maria della Vittoria, onde está a estátua “O Êxtase de Santa Tereza” de Gianlorenzo Bernini, escultor italiano do Século XVII. Algumas das obras de Bernini fazem parte do item 3. Apesar de ser amigo pessoal do Papa Urbano VIII e “escultor oficial” do Vaticano, Bernini fazia umas esculturas meio… sexies… Essa era uma delas…

Foi difícil achar a igreja porque ela, como tudo que eu quero visitar quando faço uma viagem, estava reformando e assim era difícil diferenciar a fachada ou ler o nome dela em algum lugar. E quando eu finalmente achei, descobri que estava fechada e que voltava a abrir no fim da tarde. Voltei no hotel pra fazer o check-in que eu ainda não tinha feito por ter chegado lá antes de 13:00, deixei as coisas no quarto e voltei pra rua. Passei com calma pela Piazza della Repubblica, já que da vez passada passei correndo porque tinha começado a chover, e finalmente consegui entrar em Santa Maria della Vittoria. Bem modesta a igrejinha, mas no fundo à esquerda… Não entendo nada de arte, mas sou capaz de apostar meu braço que o Bernini só perde pro Mike nesse negócio de tirar gente de dentro dos blocos de mármore. Seguramente o pedido da Igreja foi que ele representasse o êxtase de Santa Tereza ao ter uma experiência divina. Dá uma olhadinha na foto aí embaixo… Olha o que Gianlô fez…

O Êxtase de Santa Tereza, Gianlorenzo Bernini

Depois de andar um pouco por essa região, à noroeste da estação de Termini, onde eu não tinha ido muito da outra vez, e localizar um dos quatro altares da ciência do filme (item 3), voltei pro hotel e depois fui encontrar com as meninas, que chegavam às 18:30 no Fiumicino. De acordo com meus cálculos somando imigração com a ida até o centro de Roma elas só chegariam lá pelas 21hs. E foi marromeno isso mesmo. Saímos todos pra comer alguma coisa bem rapidinho, pra descansar porque no dia seguinte tinha o Coliseu, o Foro Romano e o Vaticano.

No dia seguinte, o dia 24, de manhã começou a via-crucis. Se sou eu o encarregado de uma expedição, o ritmo é frenético, mermão! De manhã, fui guiando as meninas pelo mesmo caminho de 6 anos atrás, em que eu vi o Coliseu surgir todo bonitão por entre dois prédios. De diferente no Coliseu, só a mostra de arte do interior, mas ela sempre é diferente mesmo. O tema era Nero, mesmo com o prórpio nunca tendo entrado no Coliseu, construído depois da sua morte. Na época de Nero, no lugar do Coliseu ficava um piscinão gigante. Aprendi andando pelas cidades romanas que as thermas eram coisa séria. Eles curtiam uma sauna… Mas o piscinão de Nero era só de enfeite mesmo. Esse curtia uns adornos. Um jóquei de jibóia…

Saindo do Coliseu fui, carregando o povo, pra onde eu achava que era a entrada do Foro Romano. Ou pelo menos onde ela era. Não é mais. E fomos descobrir isso depois de uma longa caminhada, que nos deixou sem mais tempo, porque já tínhamos os ingressos do museu do Vaticano comprados, pras 12:30h. Pega o metrô pro Vaticano (Roma tem 2 linhas de metrô… DUAS!!!!!! Londres, Paris, Madrid, Barcelona, Berlim, têm mais de 10. Roma tem duas. E sempre imundas!), retira os ingressos, almoça no restaurante do museu, que nem é tão caro pra um restaurante que fica dentro de um dos países (talvez o mais) ricos do mundo, e pica a mula pra Capela Sistina. Eu ficaria olhando pra aquele teto até o pescoço travar… Êita Mike…  E nós tivemos que fazer o trajeto até a Capela Sistina (que os cardeais faziam a cavalo antigamente de tanta preguiça) 2 vezes. Isso porque nós queriamos sair pela saída que liga a Capela diretamente à Basílica de São Pedro, mas descobrimos que se saíssemos por lá eu não poderia voltar pra pegar minha mochila, que tinham me obrigado a deixar no guarda-volumes. O jeito foi dar a volta… Uma senhora volta, com direito a chuva no trajeto de volta à Praça de São Pedro.

O salafrário do guardinha do Museu do Vaticano falou errado o horário de fechamento do interior da Basílica de São Pedro, que fechava mais cedo no dia, devido à Missa do Galo. Não deu pra entrar na basílca. O jeito foi ir para as margens do Tibre, passando pelo Castel Sant’Angelo, até Piazza Navona. Antes, porém, uma olhada na arquitetura da Praça de São Pedro, mais precisamente no obelisco e nos adornos que representam os pontos cardeais (bate o carimbo do Item 3!! West Ponente, o altar número 2!). Quem fez? Oh yeah! Bernini!

Andar pelas margens do Tibre, ver o Castel Sant’Angelo de perto, ver a “Fontana dei Quattro Fiumi” (a Fonte dos Quatro Rios) em Piazza Navona. Porque mesmo que eu não fiz isso da outra vez? Sei lá… Sei que é bonito! As barraquinhas estilo “feira hippie” avacalharam um pouco o visual da Piazza Navona, onde ficam várias embaixadas, inclusive a brasileira, mas e daí? Parada obrigatória pra quem vai a Roma. E tem muitos bons restaurantes na vizinhança! A gente até parou pra conferir um deles! As três fontes da praça são espetaculares!!! Perguntinha… Quem fez elas? Será que foi o Bernini? Então… Foi…

O plano era voltar pro Vaticano e assistir a Missa do Galo, nem que fosse pelo telão. Mas eu tinha matado as pobres-coitadas de tanto andar e elas colapsaram quando chegaram no hotel, depois de uma passadinha no Pantheon (nunca tinha reparado que o “óculo” do Pantheon é completamente aberto. Se chover, chove dentro da igreja e o chão no centro é côncavo pra fazer escorrer a água) e na Fontana di Trevi. Somado à isso, Roma, uma cidade de quase TRÊS MILHÕES de habitantes, desativou TODO o seu sistema de transporte na noite do dia 24, a partir das 21:00. Me restou fazer uma caminhada de 40 minutos forever alone até o Vaticano. Decidir voltar pro frio e fazer esse cooper até a Praça de São Pedro não foi fácil! Precisei de gente me incentivando a fazer isso. Pena que as principais incentivadoras não vão ler isso. Uma odeia blogs! A outra só entende 5 palavras em português: “Ai se eu te pego!”.

Valeu a pena! Cheguei no exato momento em que a Missa do Galo, celebrada pelo Papito em pessoa, começava. Os ingressos se esgotam em setembro, vi tudo pelo telão, comendo um Panino. Liguei pra minha mãe, pros meus amigos, tentei dividir o momento com o máximo de gente que eu pude. Não vou nem tentar colocar em palavras o que é estar na Praça de São Pedro na noite de Natal. Vou até passar pro próximo parágrafo…

No dia 25 continuei matando as meninas de tanto andar. Vaticano pela manhã, assistimos uma missa DENTRO da basílica às 10:00, mas não foi o Papa que celebrou. E na saída, Papito deu a benção de Natal da sacada da Basílica, que a gente assistiu de pertinho. Depois fomos de volta às margens do Tibre em direção à Piazza del Poppolo, onde eu tinha passado o ano novo de 2005 pra 2006. Na época ela estava reformando, dessa vez deu pra ver as igrejas gêmeas e o obelisco lindões, já restaurados. Carimba o item 3 aqui pra mim! Na praça fica a Chiesa di Santa Maria del Poppolo e dentro a Capela Chigi, desenhada por Rafael, ele mesmo, a tartaruga ninja. O altar número 1. Que eu não pude ver… Restaurando… =(

Piazza di Spagna, Monumento a Vittorio Emanuele II, Piazza Campidoglio (onde tem a loba amamentando Rômulo e Remo) e a vista do Foro Romano by night fecharam o tour de Roma pras meninas. Missão cumprida. Tudo de mais espetacular que Roma tem pra oferecer em 2 dias! Teve um pequeno custo… Bolhas no pé e ódio mortal da minha figura pra sempre. MATEI elas de tanto andar! A Carol, que teve que ser amparada depois que as botas fashion destruíram seus pés (eu sou véi-de-guerra… fui de tênis de corrida, com amortecedor e terminei o percurso zero-bala) e hoje em dia ela não fala mais comigo! Só que isso se deve aos ares de Paris, que ela anda respirando e o francês que ela anda aprendendo, tudo isso vai deixando aquele narizinho minúsculo empinado! Mas que elas viram Roma elas viram! Na volta pra casa demos uma parada no McDonald’s em frente à estação de Termini. Paguei no cartão e fiz o favor de esquecer ele lá.

No dia seguinte, logo de manhã, depois de perceber a ausência do cartão na carteira, “freak the hell out”, pensar que ele tinha ido pro lixo, mas lembrar que eu nunca tinha pegado ele de volta da máquina e portanto poderia ter sido guardado por uma das atendentes, como de fato foi (yay!!), ajudei as meninas com os últimos preparativos pra ida ao Fiumicino pra pegar o avião pra Berlim. E depois voltei no Foro Romano e na praça do Campidoglio, onde fica a prefeitura de Roma e o Museu do Campidoglio, que é muito bonito! A estátua original da “Lupa Capitolina” e a Medusa de Bernini ficam lá. A Medusa estava emprestada para o museu de San Francisco… Jura? Juro… Depois voltei no Vaticano pra subir na cúpula da Basílica de São Pedro. Consegui veri a Capela Sistina lá de cima, mas não tinha certeza qual era a danada da chaminé por onde saem as fumaças preta e/ou branca, quando fazem o Conclave…

Depois descobri que a vista de Roma, desde o terraço do Castel Sant’Angelo é a mais bonita de todas! Dá pra ver o centro da cidade (onde estão o Coliseu e outros monumentos) e a Basílica de São Pedro de muito perto. Com o Tibre passando no meio. E por acaso o sol inventou de ir embora enquanto eu estava lá em cima. Simplesmente fantárdigo… Continuei margenado o Tibre pra ver a Isola Tiberina, uma ilha no meio do Tibre onde tem um hospital. Uma caminhada pelo Circo Massimo, onde tinham lugar as corridas de bigas da Roma antiga e depois metrô pra casa. Arrumar a mala e deixar tudo no esquema pra mais um migué na política anti-bagagens da Ryan Air.

1 – check!

2 – check!

3 – check!

Na manhã seguinte fui pro aeroporto com a sensação de missão cumprida e de que da próxima vez que eu tiver que andar por Roma ou tiver que mostrar Roma para alguém eu vou fazer isso não como alguém que tem noção de onde ficam os principais lugares ou de quanto tempo e quanto dinheiro se gasta pra chegar até lá, mas como alguém que se sente em casa!

Simbora pra Espanha!

Abraços a todos!

P.S.: Um bônus pra quem leu até aqui (oi mãe!!). A legenda da primeira foto. Nos domingos e feriados eles fecham a Via dei Fori Imperiali, a avenida que liga o Monumento a Vittorio Emanuele ao Coliseu. E se pode andar no meio da rua, com o Coliseu no horizonte. É simplesmente espetacular…

P.S. 2: Narizinho, na eventualidade de você ter chegado até aqui, eu tava brincando, vc sabe, né? =)

Em cima: Carol, Aline e Ana no Coliseu. A Fonte dos Quatro Rios em Piazza Navona e a vista da Basílica de São Pedro do alto do Castel Sant’Angelo ao pôr-do-sol. Em baixo: O Tibre, o Castel Sant’Angelo e o chão do Pantheon molhado depois da chuva.

Os Sassi de Matera

O Sasso Barisano

“Tenho muito orgulho do jogar na terra onde Cristo nasceu!” Jesus não nasceu em Belém do Pará, como o ex-jogador Claudiomiro, meia do Internacional de Porto Alegre nos anos 70, afirmou às vésperas de um jogo do Inter contra o Paysandu pelo Brasileirão de 72. E também não foi crucificado em Matera, como mostrado em dezenas de filmes sobre o Messias, sejam eles italianos ou hollywoodianos. O último deles, A Paixão de Cristo, foi dirigido por Mel Gibson, entre 2003 e 2004.

Os “Sassi” (se trulli é o plural de trullo, sassi é o plural de sasso, italiano para “rocha”) de Matera são constituídos de casas de mais de 900 anos de idade e se assemelham à Jerusalém de 2000 anos atrás, por isso a preferência do lugar para rodar os filmes. Assim como os Trulli de Alberobello, também são patrimônios da humanidade tombados pela UNESCO.

Diferentemente de todas as cidades que apareceram nos textos até aqui (tirando Londres, óbviamente) Matera não fica na Apulia, fica na Basilicata. Pra chegar até lá foi necessário o sacrifício de acordar às 7:00 da madrugada em um sábado, pegar o trem das 8:00 pra Bari e depois o das 10:53 até Matera. 1h e 30 minutos cada trecho. A cidade tem cerca de 55.000 habitantes e uma parte mais moderna, com prédios mais novos, além dos Sassi. Neles, as casas ficam encrustadas em dois vales, e cada conjunto de casas tem um nome diferente, Sasso Barisano (ao norte) e Sasso Caveoso (ao sul). Além das casinhas antigas (e coloca antiga nisso, eu empurrei algumas com as mãos, pra ter certeza que elas não iriam cair), as montanhas que ficam atrás dos Sassi contribuem muito pro o visual.

Saindo da estação, a primeira coisa a fazer é a de sempre. Arrumar um mapa. Sou meio “old-fashion” nessas horas. O celula tem GPS e tal, mas a bateria dura menos de um dia e os mapas não tem a riqueza de detalhes que um mapa normal teria. Normalmente vou até algum centro de informações turísticas, mas como tinha chegado depois de 12:00 achei que ele poderia estar fechado, além de que sempre é difícil encontrar um em cidades pequenas. Olhei direto na banca de revistas perto da estação e tinha. Daqueles turísticos, gigantes, que te faz parecer um mané enquanto consulta ele no meio da cidade. Tô nem azul, me fala outro jeito de andar pela cidade com alguma noção do que tô fazendo?

Fui andando no meio das casinhas em que se destacam a Chiesa Madonna de Idris e o Duomo (as fotos delas estão no link, na home do blog) de Matera. Uma outra atração da cidade é o antigo sistema de coleta de água, entrei em um museusinho que mostrava como a água da chuva era coloteda e direcionada pra dentro de uma cisterna pra abastecer a população há no início do Século passado.

No mais era andar no meio das casas, um ou outro museu a mais pra ver, mas, como sempre, a maioria deles fechados. Por último, aproveitando o fato de que a noite cai bem cedo agora no inverno, perto das 17 horas, fiquei pra ver as luzes dos sassi se acenderem, dá um “look” meio diferente nos sassi, `medida que as luzes vão acendendo, óia aí embaixo como fica!

Abraços!

O Sasso Barisano by night

Os Trulli de Alberobello

Sério… Não sou muito fã daquele símbolo ali do terceiro Trullo, da esquerda para a direita. Não costuma dar muito certo…

“Green Bay Packers?? I am from Green Bay!! Let’s take a picture!!” E viva o Futebol Americano! Andava eu tranquilamente pelas ruas de Alberobello, quando um senhor, norte-americano, passeando pelo sul da Itália com a esposa, avistou minha camisa do Green Bay Packers, e soltou a frase aí em cima absolutamente emocionado! Essa camisa, que foi me dada de presente pelos sogros da minha prima Mailén, que mora nos Estados Unidos, rendeu uma foto (que a anta de cabelo pixaim parecida com a Medusa aqui fez o favor de esquecer de pedir pra tirar DUAS fotos, uma com cada máquina) e uns 10 minutos de conversa sobre o melhor esporte já inventado pela humanidade (problemas se a bola é oval, se carregam ela com as mãos e se neguim precisa de usar capacete pra terminar um jogo vivo).

Falando em humanidade, os Trulli (plural de Trullo), casinhas construídas com pedra à seco, meio que em formato de oca, de Alberobello são patrimônio da humanidade, tombado pela UNESCO. A cidade fica a duas horas e meia de trem de Lecce e à medida que subimos a Apulia (Alberobello fica mais ou menos na metade da região, que pega do salto da bota até o tendão-de-Aquiles) podemos notar vários deles quando passamos de trem pelas “zonas rurais” daqui. Os Trulli de Alberobello são especiais. Muitos deles têm símbolos pintados na parte de cima, que se dividem em “Primitivos”, “Cristãos” e “Mágicos”, talvez refletindo a crença de seus antigos donos. Hoje a maioria deles são lojas de souvenirs, com jardins nos fundos. A maioria dos donos das lojinhas deixa entrar de grátis nos jardins pra bater foto. Em um deles tinha uma vista panorâmica espetacular! Em outro uma maquete completa da região da cidade onde ficam os Trulli. Além dos símbolos pintados, as pontas das “ocas” também são diferentes, o que poderia ser uma indicação de uma espécie de assinatura do mestre-de-obras (ou mestre-de-Trulli) responsável pela construção.

Três Trulli se sobressaem entre os demais. O Trullo-Siamês, dois Trulli com os tetos “emendados”, o Trullo-Igreja, que é er… uma igreja e o Trullo Sovrano, que foi um dos primeiros a serem construídos em dois andares. Ele é também um museu e permite ver como é um Trullo por dentro. Além dessa região, situada em um morro, onde os Trulli são lojinhas, na parte plana da cidade, existe um segundo conjunto de Trulli que são residenciais. E na parte nova da cidade também surgem alguns em meio aos prédios mais modernos. Constraste bacana de ver…

Além dos Trulli, é comum visitar a Basíllica de São Cosme e São Damião, os padroeiros da cidade e alguns museus, todos fechados, pelo menos hoje. Acabei ficando mais tempo no trem, entre as 2hs e meia pra ir mais outras 2hs e meia pra voltar do que na cidade. 3 horas é tempo suficiente pra escanear Alberobello de cima em baixo! As fotos estão em um dos links do lado direito, na “home” do blog.

Tchau, mãe!!

Escuta o Véio!

A distância entre minha casa e o supermercado mais próximo. Praticamente um centro de treinamento para a prática do mais nobre Mandamento Véial.

Geesthacht, Alemanha. Segundo semestre de 2005. Esse post começa sem a frase, porque a frase já está no título. “O Véio”, como ele se auto-intitulava era a referência principal, não só pra mim, mas para todos os estagiários que chegavam à GKSS, vindo de todas as partes do mundo, em termos de… bem em termos de tudo! “Como faz pra chegar em tal lugar?” Pergunta pro Véio que ele sabe. “Se eu precisar de comprar ração de cachorro, onde é mais barato?” Eu não sei, mas o Véio sabe. “Minha orelha caiu da cabeça!” O Véio leva no hospital.

Sinônimo de como levar uma vida praticamente sem preocupações (eram 4 preocupações básicas Friction Welding, nossa família, onde tomar uma hoje e o futebol. NECESSÁRIAMENTE nessa ordem. Como a gente tava longe, o trabalho tinha que vir em primeiro lugar, pra poder voltar pro povo, que foi o que ele fez!), os ensinamentos véiais eram observados por todos com atenção. E um deles, eu posso falar com segurança, aprendi (ou aperfeiçoei, porque já estava no sangue) à perfeição: a arte da chinelagem. Segue a definição.

Chinelagem: s. f. “1 – Prática comercial na qual o cliente paga por um produto um valor que ele julga adequado ou ainda um valor abaixo do adequado. 2 – Produtos em oferta, por um preço inferior à um valor de referência, arbitrariamente imposto pelo praticante, ou o chineludo”

Os supermercados, alvo central da prática da chinelagem, eram classificados em 5 níveis de acordo com a razão qualidade/preço. De cada 10 idas ao “super” umas 6 eram no Aldi (nível 1),  uma outra no Penny (nível 1), umas duas no Lidl (nível 2) e uma no Plaza (nível 3). Os níveis 4 e 5 eu não cheguei a conhecer. Leite? Mais de 0,50€ tá caro! Queijo? Não passa de uma prata. A camisa pode ser de marca? Deve! Mas não pode passar de 10 €.Home Theater 150 €? Não… Tem que ser menos de 100 € (achamos por 90 €). A prática se estendia à lojas de eletrônicos, roupas, artigos esportivos, departamento, construção, tudo. Nem a Arena de Hamburgo, estádio do HSV, um dos palcos da Copa de 2006, escapou. “Os fudido da 9C” estavam lá domingo sim, domingo não. Preço: 15 €. Nenhum Euro era gasto sem alguns (valiosos) minutos de reflexão. O chineludo deve ser paciente, mas a prática tem sua grande vantagem. A chinelagem te livra de todo e qualquer problema de ordem financeira, te faz trabalhar melhor e conseqüentemente aproveitar melhor tudo que a Europa tem pra oferecer. Se os mandamentos véiais fossem escritos em uma tábua, a chinelagem estaria no topo, vencendo por milímetros outro sábio mandamento: “não passar vontade”.

O objetivo desse post é simplesmente ressaltar o legado do Véio. A chinelagem ainda vive e é praticada com intensidade aqui em Lecce. O alvo principal é o supermercado que está do outro lado da rua. Sacou a foto aí em cima? O prédio da esquerda é onde eu moro, do outro lado da rua o CONAD. Tenho a “Carta CONAD” que dá descontos exclusivos e acumula pontos pra ganhar mais descontos lá na frente. Por exemplo, as birita de domingo pra tomar vendo o Futebol Americano, qual eu escolho?? A que tiver o preço reduzido pela “carta”, óbvio. Cada semana é uma e semana passada era a Heineken! Um pila pela garrafa que custa uns 4 reais no Brasil… Pra utensílios para a casa, que eu precisei logo quando mudei, o lugar chama Happy Casa (nenhum IKEA perto, o Véio recomendaria os suecos nessas horas…), fica em uma cidade vizinha chamada Surbo, tem que ir de ônibus, mas as coisas chegam a ser 50% mais baratas do que a média dos preços. Pra eletrônicos tenho aqui a mesma rede tínhamos em Hamburgo, perto da estação de Altona. Media Markt na Alemanha, Media World na Itália, mas a mesma loja.

A Itália está meio em crise é verdade, algumas coisas chegam a custar três vezes o preço que custavam em 2005, na Alemanha, mas nada que um chineludo atencioso não consiga driblar. Ou de repente andar alguns quarteirões a mais e ir comprar em outro supermercado. Tudo em nome da vida tranqüila, sem preocupações.

Por último deixo pro Véio a frase que eu coloquei na minha dissertação de mestrado, que eu sempre quis mostrar pra ele, mas que eu sempre esqueci de pegar uma cópia na minha sala e levar pra algum churrasco.

“Um agradecimento importante ao Véio, que me fez descobrir a “veia experimental”. Valeu demais pelo Geile Zeit em Geesthacht!”

Véio, veia… Ficou difícil essa, né?

Abraços a todos!

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